sábado, 1 de janeiro de 2011

Resenha | Vinte Anos de Crise - 1919-1939 | E. H. Carr

Resenha proposta pela disciplina Economia e Política Internacional.


Edward Hallett Carr, londrino, autor de 20 Anos de Crise, nasceu e viveu na era vitoriana, época da maior projeção do império britânico no cenário mundial nos âmbitos econômico e político. Vivenciou seus momentos dourados, bem como o de sua decadência frente a ascensão dos Estados Unidos no sistema internacional e, precisamente, o período entre-guerras que marcou o momento de maior crise entre a realidade dos interesses e as ideias de paz – dadas como utópicas - entre as nações que participaram da Liga das Nações, representadas pelos indivíduos, representantes das nações que participaram de sua formação, atuação e posterior fracasso.

O autor analisa e interpreta o período entre-guerras com base a cientificar o processo da Política Internacional, iniciando no discurso sobre o significado e análise da realidade dos fatos, o que leva primeiramente ao “objetivo”, aqui exposto como “a paz entre as nações”, que alimenta o pensamento para o desenvolvimento de tentativas de resolução do problema analisado; e da “utopia”, sendo como “soluções imaginativas”, o “novo”, ao que o texto, no contexto abordado do entre-guerras, faz referência à criação de um “Estado Mundial” e de uma “segurança coletiva” centrado num forum qual seja, a Liga das Nações.


Pode-se considerar a questão da real intencionalidade e percepção dos indivíduos envolvidos, ao qual aponta as “suposições não verificadas sobre o comportamento humano”; ou seja, quando há ou não a vontade de resolver o problema, as pessoas podem querer ou não fazer, o partir ou não para sua execução, promovendo ou não a ação que construirá, da melhor forma possível por meio das tentativas, a solução para o problema; conforme o autor afirma, seja para a cura de uma doença, a construção de uma ponte ou a solução de um problema de cunho político, assim promovendo bases teóricas em conjunção com a prática nos referidos campos do conhecimento, o que resulta nas Ciências -  Médica, Engenharia e Política, por exemplo. E isso é demonstrado por Carr, quando responde do porquê da “utopia” não se tornar realidade quando afirma que,
um dos fatos cujas causas terá de analisar é o de que poucas pessoas realmente desejam um “Estado mundial” ou “segurança coletiva”, e as que pensam que desejam, conceituam estas coisas de forma diferente e incompatível. Ele terá, por fim, alcançado um estágio em que o objetivo, por si só, revela-se estéril, e a análise da realidade impõe-se a ele como um ingrediente essencial de seu estudo”. (CARR, 1981, p.14)

Sua obra é uma crítica às ideias e práticas dadas como utópicas, afirmando e dando relevância ao Realismo quando expõe, com relação ao fato do interesse na criação de um Estado mundial e de uma segurança coletiva, sendo analisado com bases no comportamento humano e na sua real intenção do que era desejado (a utopia) e o executado (o agir para tal, tornar realidade) dos objetivos citados, proporcionando o vislumbre de que realmente não era o objetivo real a ser alcançado pelos Estados, representados por seus estadistas; fato demonstrado pelo aumento da tensão no entre-guerras culminando na 2ª Guerra Mundial.

Dadas estas condições, a obra perpasssa o momento histórico em que, vivenciado pelo autor, busca-se a manutenção do status-quo no sistema internacional, tendo a Grã-Bretanha como potência dominante, mas que já não conseguia se manter como tal desde o fim da 1ª. guerra mundial.

O sistema internacional estava mudando, e com a ascensão dos Estados Unidos e sua política protecionista, estava se tornando o maior exportador de bens de consumo e de capital, e a Grã-Bretanha tentava restaurar, ou retornar à época relativa ao fim do século XIX, onde vivenciara o auge de sua atuação como potência européia. Carr percebendo os interesses que determinavam a ação dos Estados e que estes tinham seus próprios objetivos e a forma de empregá-los; na obra, revela que a harmonia de interesses entre as nações não passava de uma forma de tentar manter o sistema político e econômico do século XIX, que era sustentado pelo padrão ouro e pela hegemonia britânica que, após a 1ª. guerra mundial, passava por crise que estava mostrando que o entre-guerras estava sendo o momento que simbolizava, definitivamente, uma ordem política e econômica mundial que estava em franca decadência.

Com a crise da economia européia em si, que sustentava a hierarquia entre os Estados naquela época, colocou-os em extrema tensão, principalmente àqueles que, dificilmente estavam em aceitar a realidade da perda de poder, bem como sua posição no sistema internacional; daí o fato de Carr apontar em sua obra, com base nas ideias utópicas ou o que se falava, e na realidade ou o que se executava, não haver coerência entre estes pontos onde via como base da crise, a incoerência no trato do poder com a moral, bem como nos fundamentos do Direito e a forma no trato de litígios,  repercutindo na incoerência da real intenção e ação dos estadistas, tão dita pautada na harmonia de interesses, que não se alinhava com o que era tratado na Liga das Nações, onde se mais enxergava os próprios interesses na manutenção do status quo, no afã em trazer de volta o cenário político e econômico da belle époque vivenciada pela Europa até o início da primeira grande guerra.


Leandro Guiraldeli

Resenha: A Ambição Imperial – G. John Ikenberry

Resenha proposta pela disciplina de Relações Internacionais Contemporâneas.

O autor esclarece sobre as estratégias macropolítica e econômica norte-americanas, onde se observa os interesses dos EUA de se manterem e se perpertuarem como hegemônicos no sistema internacional, sendo após o fim da 2ª. guerra mundial e após o ataque às torres do World Trade Center, onde cada fase haveria de produzir suas repercussões de acordo com seu contexto e que os fatos políticos e econômicos que geraram suas consequências, no antes e principalmente no após aos ataques às torres gêmeas, explicam o seu papel de hegemônicos, e que, utilizando de argumentos com fins a justificarem a sua defesa, dão-se a liberdade de atuarem além dos tratados e da soberania dos Estados  – denotando uma hegemonia imperialista - frente ao sistema internacional.

As duas macroestratégias, mesmo pautadas em tradições intelectuais divergentes, funcionaram com eficiência desde a década de 40, representadas pela realista e liberal. A macroestratégia realista promoveu importantes compromissos de segurança em todo o sistema internacional, enquanto que a estratégia econômica, pautada na tradição liberal, promoveu uma nova ordem por meio da abertura comercial, da democracia e de relações institucionais multilaterais, denotando que, por trás deste estratégia, os EUA haveriam de se valer de seu peso político para criar as regras que lhes agradassem e que protegeriam seus interesses na manutenção de seu poder e na ampliação de sua influência no sistema internacional. Assim, promoveram-se resultados positivos para a liderança norte-americana, exercendo seu poder ao mesmo tempo que puderam ter seus interesses atendidos, bem como o fortalecimento da rede constitutiva da comunidade internacional que se formou após o fim da Guerra Fria, conforme expressa por Ikenberry:
O estabelecimento de acordos com base em regras e parcerias políticas e que visam a segurança trouxe resultados positivos tanto para os Estados Unidos como para boa parte do mundo. Por volta do final dos anos 90, o produto dessas relações foi uma ordem política internacional de porte e sucesso sem precedentes; uma coalisão global formada por Estados democráricos e unida por meio de mercados, instituições e parcerias de segurança. (IKENBERRY, 2003, p.26)

Em suma, essa ordem foi erguida por meio de barganhas, com os EUA assumindo compromisso de proporcionar segurança aos parceiros asiáticos e europeus e no acesso aos mercados, à tecnologia e produtos norte-americanos na economia global aberta, tendo em troca, a devida confiança no fornecimento de apoio diplomático, econômico e logístico aos Estados Unidos, complementado pela barganha liberal, no qual os Estados asiáticos e europeus concordaram na aceitação da aliança dos EUA tendo-se inseridos no sistema político-econômico, de comum acordo. Isso proporcionou aos EUA o poder como hegemônicos, proporcionando segurança ao mundo, ao mesmo tempo que, em troca, os Estados concordaram em viver segundo seus valores.

Após o ataque sofrido às torres gêmeas, o governo norte-americano se vale do seu poder para dar forma a uma nova macroestratégia contra o terrorismo, alterando seu modo de lidar com o sistema internacional, sob nova postura de afrouxamento dos vínculos e das regras antes instituídas com seus parceiros globais, exercendo papel mais unilateral e preventivo, valendo-se de seu poderio bélico na gestão de uma nova ordem global pautada na segurança.

Os EUA iniciam esta nova fase, com foco na manutenção de seu status de hegemônico, baseando-se em sua força bélica, não mais se pautando pelas macroestratégias realistas e liberais, deixando sem sentido os antigos acordos e alianças e tomando para si o papel de protetor do mundo, o fiscalizador do cumprimento das regras; por meio de uma segurança paternalista pautada na autoridade da força militar ao invés da autoridade moral, de forma que nenhum outro Estado possa se equiparar ou desafiar o seu poder. Se vale desta prerrogativa, com base em ações preventivas, de passar por cima da soberania de outros Estados em busca do seu intento, onde quer que seja, para aniquilar com forças terroristas, mesmo sem ter a visão clara das ameaças.

O autor aponta como riscos da nova macroestratégia neo-imperial, a atuação dos EUA “destituídos de legitimidade e desvinculados das normas e instituições da ordem internacional do pós-guerra”, tornando-se mais hostis e proporcionando maiores dificuldades à concretização dos seus interesses, por fim, colocando-se em situação insustentável.

Com esta atitude, não consideram a decisão final das Nações Unidas, invadindo o Iraque sob pretexto de possuírem armas de destruição em massa – o que não foi provado - gerando grandes ônus decorrentes da manutenção das forças militares na restauração do Iraque e na manutenção das forças militares no Afeganistão, sem sucesso na captura de quem consideram ser o mentor dos ataques às torres gêmeas.

Por sua manifestação de forma coercitiva e arrogante, pode-se comparar a possível queda dos EUA como ao de outros impérios que se utilizaram destes mesmos meios coercitivos para manifestar sua força e atingir seus objetivos, livre de restrições impostas por regras ou normas de legitimidade. Essa atitude promoveu o sentimento anti-americanista no mundo, seu descontentamento com uma ordem internacional em que os EUA jogam de acordo apenas com suas próprias regras e que, direta ou indiretamente, tem-lhes causado grandes problemas por meio de crises financeiras.


Leandro Guiraldeli

Resenha: O Racista Mascarado – Carlos Fuentes


Resenha proposta pela disciplina de Relações Internacionais Contemporâneas.

Fuentes, no presente artigo, apresenta crítica a Samuel Hantington e sua obra “O Choque das Civilizações”, onde aborda a questão do xenofobismo apresentado pelo autor norte-americano e apresenta contra-argumentações contundentes de que, o choque inicial entre as civilizações, dada a forma dos contextos como ocorrem, podem muito mais enriquecer as culturas, dadas a multiplicidade de conhecimentos e o somatório de experiências, antes consideradas por Hantington como uma ameaça ao que Fuentes considera como um “puritanismo, que se encontra na base da cultura [...] dos Estados Unidos, que manifesta-se de tempos em tempos com cores chamativas”, e que agora, tem como alvo os latino-americanos provenientes do México, que somente vão trabalhar nos EUA, justamente por este promover a demanda, neste caso, para os mexicanos.

Estes são considerados por Hantington, uma ameaça à sociedade norte-americana, como invasores, exploradores e empobrecedores da economia, ensinuando atuarem como promotores de movimentos separatistas para a formação de uma nação à parte, onde apenas o espanhol fosse a língua oficial.

O autor contra-argumenta destacando a contribuição dos latino-americanos nos Estados Unidos, que bancam grande parte dos impostos e promovem grande força na economia, à qual geraria grande crise caso deixassem de atuar nela. E caso não fossem realmente importantes, não teriam chamado a atenção da classe política em promoverem seus programas televisivos em épocas de eleição, dirigidos aos imigrantes na língua espanhola.

Exemplifica a qualidade dos latinos em absorverem os costumes locais, sem perda de sua própria cultura, ressaltando o multiculturalismo promovido pela descendência espanhola, a qual não é inteiramente compreendida se não considerada toda a sua riqueza de sua formação racial e linguística, escancarando a atitude xenófoba e isolacionista do autor norte-americano.

Coloca em xeque a atitude isolacionista do autor norte-americano, promovido pelo medo da “balcanização” da sociedade norte-americana pelos mexicanos que, por natureza, sendo latinos, tem em sua manifestação o respeito pela diferença e pela diversidade, a começar pelo reconhecimento de si próprios, do reconhecimento pela interdependência e na valorização do ser humano em si, em “admitir que uma cultura perece no isolamento, mas se fortalece no contato com outras culturas”, argumentando que “a Itália romana, a Espanha ibérica e a França gaulesa enriqueceram-se entre si e enriqueceram as atuais sociedades do novo e do velho mundo”. (FUENTES, p. 63)

Considera o choque de civilizações uma ideologia de combate e medo, considerando por parte dos EUA, em ser uma potência, o perigo de definirem por si mesmos quem são bons e quem são maus na história das civilizações, provocando aumento do xenofobismo entre culturas, pautado em ocupações neocoloniais e principalmente na ignorância sobre as realidades culturais de outras sociedades, salientando que “o respeito ao desenvolvimento histórico  interno de uma sociedade e o respeito à ordem jurídica internacional são as bases para a construção comum de valores e um verdadeiro diálogo, e não, choque de civilizações” (FUENTES, p. 64), dando ênfase à questão de que, sucesso e fracasso em si não existem, e sim a forma de como os acontecimentos humanos são vivenciados de forma como são usados os instrumentos culturais de que dispõe as sociedades.

Está claro que, conforme Fuentes, a cultura isolacionista norte-americana e sua auto-determinação de “nação-exemplo” podem se tornar uma grande fraqueza de sua sociedade, colocando em contradição a sua tão propagada posição de país democrático.

Leandro Guiraldeli

Resenha: O Fim da Guerra Fria, a Guerra do Golfo e a noção de “Nova Ordem Mundial” - Georges Lamazière


Resenha proposta pela disciplina de Relações Internacionais Contemporâneas.

O autor apresenta em seu texto, o encadeamento de ideias sobre a sequência de acontecimentos desde o fim da guerra fria até a invasão do Iraque pelos Estados Unidos, os motivos segundo os planos estratégicos-militares norte-americanos para a construção e manutenção do que denominaram de “nova ordem mundial”, quando da queda da União Soviética, um dos pólos que mantinham o equilíbrio de poder na bipolaridade política-econômica-militar pós 2ª guerra.

Após a dissolução da URSS, a invasão do Iraque ocorre pautada na tecnologia e estratégias militares norte-americanas como forma de mostrar a hegemonia dos Estados Unidos ao mundo, bem como a supremacia política-econômica capitalista. Contudo, a ordem no sistema internacional é alterada devido a conflitos étnicos-religiosos, dando um novo parecer ao sistema internacional e novos desafios para sua manutenção, buscando por reformas ao invés de revoluções sem motivos para mais conflitos com a promessa do funcionamento do sistema de segurança coletiva da ONU, que antes estava impedido de operar na Guerra Fria.

E a invasão do Kuwait pelo Iraque, proporcionou aos Estados Unidos, motivos para chancelar sua hegemonia, demonstrando a possibilidade de ação internacional conjunta sob sua liderança, para enfrentar ameaças à paz e segurança, sendo suas ações legitimadas sob a proteção do cap. VII da Carta da ONU, colocando em evidência estar operando em temas globais, como a não-proliferação de armas de destruição em massa, direitos humanos, meio-ambiente – sendo um paradoxo, pois não participam em conjunto com outros atores em busca de soluções – e principalmente, em assegurar uma ordem regional estável, tendo a necessidade de garantir o suprimento de petróleo a longo prazo e com preços razoáveis para o Ocidente, impedindo o controle do óleo kuwaitiano pelos Iraque. Por um lado, os objetivos também reuniam outros atores importantes no jogo diplomático, com convergência e divergência de objetivos, evidenciando a complexidade no novo sistema.

A nova ordem pós-Guerra Fria também possibilitava o funcionamento, mesmo que imperfeito, do sistema de segurança coletiva da ONU, sob pretexto dos Estados Unidos, de ser tão somente a implementação dos mecanismos descritos na Carta, mas exaltando o Cap. VII quanto ao uso legítimo da força, forte argumento utilizado para a invasão do Iraque para fazer cessar seu avanço, promovendo a legítima defesa do território kuwaitiano.

Percebe-se que toda a ação norte-americana pós-Guerra Fria com a invasão ao Iraque coloca-se sob pretexto do uso do Cap. VII da Carta da ONU, retornando em pauta o assunto da não proliferação de armas e utiliando-a para o desarmamento do Iraque, com vistas à obtenção do petróleo, matriz energética que seguramente, o garante na hegemonia político-econômica ocidental, ainda que, mantendo uma unipolaridade no terreno militar, pautada em sua superioridade bélica, coloca-se como “xerife do mundo”, líder em nome da segurança coletiva para manter-se dentro da crescente multipolaridade econômica, sem, contudo, utilizar da força e sim, da ordem consentida desempenhada pelos regimes internacionais no funcionamento do sistema econômico globalizado.

Leandro Guiraldeli

Resenha: As Contradições da Manutenção da Paz – As Nações Unidas na Nova Era - James Mayall


Resenha proposta pela disciplina de Relações Internacionacionais Contemporâneas.

No presente artigo, o autor expõe as dificuldades existentes das Nações Unidas em atuar com eficiência em suas missões de paz pós-guerra fria pelo mundo, devido às inúmeras dificuldades existentes que sustentem uma coerência dos Estados em promoverem uma nova era de paz no sistema internacional.

O aumento da demanda de atividades e uma crise financeira mundial ocorrendo ao mesmo tempo, somado à falta de compreensão das culturas onde haveriam de atuar, evidenciaram a falta de organização na formação das missões responsáveis por atuarem nas regiões onde haveriam de trabalhar pela manutenção da paz nas regiões em conflito, não promovendo a eficiência da atuação da ONU.

Penso que as contradições advenham da falta de maior entrosamente entre os Estados inseridos nas missões em que se comprometeram e ao conflito de interesses dos governos envolvidos com o comércio de armas que sustentam os inúmeros conflitos regionais que ocorrem por todo o sistema internacional. Devido a imaturidade dos Estados que compõem o conjunto da ONU, tanto quanto o Conselho de Segurança, conforme afirma Mayall,
que as grandes potências estão mais preocupadas com interesses de curto prazo e com as pressões políticas do que com a conversão das Nações Unidas em um instrumento confiável para a manutenção da paz [...] difícil, pois, fugir da conclusão de que a menor qualidade das Resoluções do Conselho de Segurança revela uma incerteza bem profunda acerca do tipo de ordem internacional que elas pretendem promover (MAYALL, 1995, p. 234)
pressupõe sua baixa eficiência em suas atividades, evidenciado pela baixa qualificação de pessoal recrutado, pela deficiência de conhecimentos da língua e da cultura onde haveriam de atuar, além de não transmitirem a devida segurança, que deveria ser pautada na imparcialidade e isenção das missões dirigidas às partes envolvidas nos conflitos, denunciando uma maior atuação universalista da Organização, obviamente, dos Estados que a compõe. Observa-se regimes políticos de muitos Estados do sistema internacional que ainda não atuam de forma democrática, arraigados à sistemas políticos autoritários e paternalistas, dificultando a atuação das Nações Unidas.

Possivelmente, de todas as contradições existentes que ainda impossibilita uma maior eficiência na atuação da ONU, seja as atividades dos atores transnacionais envolvidos na produção e comércio de armas que alimentam as guerras regionais e conflitos civis, seja pela disputa de matérias-primas energéticas e tantas outras atividades promotoras de conflitos políticos e étnicos internos que promovem o fluxo da produção e comércio bélicos.

A intencionalidade de muitos governos ainda é dúbia, pois os interesses políticos e econômicos internos acabam por não condizer com os interesses promovidos pela cultura de paz promovida pela ONU. Ainda perdura a contradição dos que dizem querer a paz mas que alimentam as guerras, pois não abrem mão dos lucros que a indústria e o comércio belicista promovem, a exemplo dos Estados Unidos, maiores produtores de armas do mundo, mas que se dizem portadores de uma “nova ordem mundial”, afirmado pelo então presidente norte-americano George Bush em discurso perante o Congresso dos Estados Unidos (11.09.1990), que esta nova ordem seria para a “promoção de um mundo onde o princípio de direito suplante a lei da selva. Um mundo onde as nações reconheçam a responsabilidade compartilhada pela liberdade e justiça. Um mundo onde o forte respeite os direitos do fraco”, o que não se mostrou condizente da forma como este país atuou na ocupação do Iraque em 2003, não respeitando a decisão do Conselho de Segurança da ONU, mostrando claramente que os princípios do Conselho de Segurança ou das Nações Unidas como um todo, se aplicam à todos os Estados participantes, mas não aos Estados Unidos quando de encontro aos seus interesses particulares.

Leandro Guiraldeli

Resenha: Arms and Arms Control – Joanna Spear

Resenha proposta pela disciplina de Relações Internacionais Contemporâneas.
 
A autora aborda o assunto da proliferação de armas, tanto as de destruição de massa, quanto as de uso convencional, ocorrendo na escalada da corrida armamentista, na época da guerra-fria, onde o acúmulo das armas nucleares, por parte dos Estados Unidos e União Soviética, foi a justificativa para a segurança interna das superpotências e após seu fim, os programas de controle e desarmamento, mas também o contínuo da proliferação de armas atômicas e convencionais – incluindo armas químicas e biológicas -, abordando maior dificuldade em seu controle devido à facilidade de acesso e de transporte por atores não-estatais envolvidos em sua produção e comércio, gerando um dilema que envolve assuntos não somente de segurança, como também econômicos e de ética.
O texto expõe duas condições de proliferação – vertical e horizontal.

Na proliferação vertical, o aumento dos arsenais nucleares pelos Estados que já possuem este armamento e que no pós guerra-fria, sua manutenção ocorre por  considerarem ainda um recurso importante para sua segurança, apesar do esforço por maior controle e diminuição por meio de acordos durante e após a guerra-fria.

A proliferação horizontal demanda pelo aumento de novos armamentos e de países que não tinham e passam a detê-los, inclusive armas biológicas e químicas que são obtidas por atores não-estatais, devido à maior dificuldade em seu controle, tanto de produção quando de transporte. Na questão das armas nucleares, há o esforço dos Estados detentores em tentar impedir que outros venham a ter, bem como no possível uso pelos demais Estados e na criação de acordos para o maior controle do acesso ao material para sua fabricação.

Quatro razões expostas pela autora mostram a relevância que há pela manutenção de armas nucleares no pós guerra-fria:

1. É considerado pelos Estados que já a possuem, como recurso positivo em prover segurança.

2. Estados que não possuem armamento nuclear são incentivados a obtê-los devido à perda de garantia de defesa antes promovida pelas superpotências.

3. A combinação do aumento de insegurança somado às instabilidades regionais, quais sejam no Irã, Índia, Paquistão ou Coréia do Norte, incentivam a proliferação das armas. 

4. Experiências contrastantes do Iraque e Coréia do Norte sugerem ao sistema forte e veloz proliferação de armas, aumentando o nível de insegurança e de ameaça.



No caso das armas convencionais, o assunto é de maior relevância, pois após a guerra fria, o arsenal é numeroso e sofisticado, tendo o fluxo mantido principalmente para uso em conflitos étnicos, promovendo a manutenção dos ganhos econômicos da indústria bélica, por meio do tráfico internacional de armas  incentivado pela falta de controle e de uma regulamentação de seu comércio entre Estados.

A insegurança é tida como fonte do problema da proliferação de armas entre os Estados detentores de armas nucleares em não permitirem que outros Estados as possuam, ocorrendo em possível instabilidade caso outros Estados venham a entrar para o grupo, o que, segundo eles, não causaria instabilidade por não se perceberem como responsáveis como aqueles que já as possuem, passando a questionar sua posição de somente eles deterem armamentos nucleares. Por não sofrerem risco de serem atacados, colocam-se na posição de possuirem os armamentos como forma de auto-defesa. Isso gera o dilema da segurança; quem não possui deseja ter para não ser atacado, fazendo com que os que já possuem, aumentem mais seu arsenal com fins de prevenção, levando novamente a uma corrida armamentista.

No caso das armas convencionais, a indústria bélica se vale da instabilidade de regiões em conflito, o que demanda constante fluxo de armas, justificando a receita de Estados envolvidos em sua produção e comercialização, uma contradição no sistema internacional, onde estes defendem acordos e tratados, mas que, ao mesmo tempo, promovem a comercialização de sua produção bélica que alimentam os conflitos pelo mundo.

Leandro Guiraldeli

Resenha: Nationalism and Ethinic Conflict – Stephen Ryan


Resenha proposta pela disciplina de Relações Internacionais Contemporâneas.

O autor expõe em seu artigo o conflito entre os conceitos de Estado e Nação, o choque entre as ideias políticas do Estado e a cultura étnica de grupos de indivíduos que formam a nação, resultando em conflitos internos de base cultural e étnica que põe em risco a integridade dos países como um todo.

Para entender melhor os conflitos, faz uma distinção entre etnia e nacionalismo, sendo a etnia, a denominação do grupo que descende de uma cultura própria de um determinado grupo de indivíduos que compartilham de uma história de descendentes e possuem um senso comum de valores vivenciados em um território específico para eles, e o nacionalismo sendo um conceito moderno de etnicidade pautada em princípios políticos do Estado, prevalecendo a ideia mais avançada de patriotismo, de fato, mais ligado ao conceito de “mundo moderno”, ou seja, enquanto o conceito de etnicidade aborda os grupos de indivíduos como centro de sua cultura, o nacionalismo aborda a cultura política de uma nação como a base de cultura para todos os indivíduos que compõe o Estado, onde os grupos de indivíduos são identificados pela sua cultura como um todo, e não como grupos de diferentes culturas étnicas dentro de um território.

O aumento dos Estados-Nações no sistema internacional pós guerra-fria, demandando por maior autonomia destes territórios pleiteada por suas comunidades que neles vivem, promovem a complexidade desta nova configuração que se forma pautada nos interesses das etnias por desejarem um posto diferenciado versus a não aceitação do Estado como um todo devido à perda de território e/ou o reconhecimento do status de grupo autônomo, levando-se em consideração que, a causa dos conflitos também podem advir tanto por meio de conflitos internos motivados pela inabilidade de duas ou mais culturas da mesma nação por não conseguirem viver juntas devido à dificuldades por não se respeitarem em suas diferenças, bem como pelos fatores externos impostas por práticas coloniais,  má governança e injustiça social imposta, pontos que devem ser levados em consideração na análise das situações.

Também se observa que, a organização interna dos Estados que promovem maior justiça social, por meio do bem-estar oferecido por serviços eficientes de saúde pública e segurança, minimizam os problemas internos, o que não ocorre em regiões onde grupos étnicos que desejam criar para si, definições fronteiriças por não aceitarem as diferenças, seja de língua ou religião das outras culturas que compõe o Estado onde estão inseridos, assim, estes grupos minoritários acabam por promover conflitos internos. Outro problema geral que afetam os Estados, são provavelmente dos grupos étnicos que não aceitam o conceito nacionalista de estado soberano que lhes são impostos, ocorrendo em conflitos que geram a desestabilidade do sistema como um todo, como também a ação forçada do Estado-Nação como um todo, em promover a limpeza étnica em seu território, bem como a imposição de sua ideologia política, ocorrendo em conflitos sangrentos, exigindo ações de organizações internacionais especializados em intervenção militar, reconstrução das sociedades desmanteladas por estes conflitos em âmbito social e jurídico, em ação de julgamentos de crimes oriundos de ações genocidas. Somente a ajuda humanitária, não corresponde à melhora dos conflitos, que segundo Ryan, outros autores expõe que o declínio dos conflitos se devem ao desenvolvimento de mecanismos que lidam com os assuntos por meio da promoção de normas legais para a proteção de indivíduos pertencentes a grupos étnicos minoritários, a exemplo do Genocide Convention, embora, segundo o autor, nunca ter sido acionado a responsabilizar e punir os responsáveis por suas ações genocidas, mesmo porque, ações como da Declaration on the Rights of Persons Belonging to National or Ethnic, Religious and Linguistic Minorities, criada para a proteção de grupos minoritários e seus territórios e para a promoção de suas identidades, é frágil em suas ações, pois tem somente força moral, por não poder invadir a soberania do Estado envolvido no caso em questão.

O trato com o nacionalismo e os conflitos étnicos se torna mais complexo na política mundial contemporânea, com o surgimento de novos Estados, e com isso, a possibilidade da auto-determinação de muitas etnias e a administração de possíveis conflitos que venham a ocorrer, seja de ordem cultural ou territorial, e um sistema de governança capaz de atuar com eficiência em sociedades multiétnicas, o que tem sido demonstrado pela crescente interesse de organizações internacionais no cuidado da boa governança a nível internacional, demandando maior participação da comunidade internacional em debates que ainda necessitam de maior atenção para as questões de ocorrências intervenção ou negligência aos conflitos.


O assunto é claro na questão multiétnica pela qual passa o sistema internacional desde o fim da guerra-fria, promovido pela unipolaridade norte-americana, tornando o sistema menos coeso e sensível aos movimentos étnicos, seja pelas diferenças de valores ou pelo objetivo de se tornarem autônomos, indo de encontro aos interesses políticos e de territórios das nações envolvidas neste processo, o que demanda até hoje maior ação por parte dos organismos internacionais, necessitando de sérios debates e ações sobre uma nova abordagem em relação à Soberania, motivado pelos movimentos étnicos decorrentes no cenário internacional desde o episódio de Westphalia.

Leandro Guiraldeli

Resenha: Aspectos da Teoria de Relações Internacionais: Notas Didáticas – Gélson Fonseca Jr.


Resenha proposta pela disciplina de Relações Internacionais Contemporâneas.

O autor expõe em seu texto, um exame a respeito dos problemas relacionados à formulação teórica das relações internacionais, com base em simples premissas dos estudos teóricos que aspiram à uma validade universal, bem como tenta examinar por quais caminhos as teorias existentes são melhores utilizadas afim de explicarem os acontecimentos mundiais do sistema internacional e o comportamento dos Estados dentro deste sistema. No entanto, com a proposta de que possamos por nós mesmos, qualificarmos nossa habilidade de entendimento da política externa brasileira, expandir este entendimento a nível de sistema internacional, por meio da análise singular dos Estados envolvidos em determinado assunto por meio da agenda internacional ou de algum acontecimento de nível regional, e a necessidade de adentrar e compreender as características e interesses intrínsicos das culturas que estão sendo analisadas para se determinar as causas dos acontecimentos que venham a promover um desiquilíbrio em todo o sistema.

O autor comenta que as teorias de relações internacionais buscam formular conceituações com o fito de explicar os conflitos entre os Estados, desde suas ocorrências, suas motivações e o seu desenvolvimento, bem como distinguir os diferentes níveis de atores envolvidos nos acontecimentos. Procura-se construir uma visão de conjunto das dificuldades encontradas para a formulação teórica que possa esclarecer de fato, o cerne dos problemas que geram os conflitos entre os Estados.

Penso que, devido à multiplicidade das características humanas que compõem as sociedades dos Estados, seu passado cultural e muitos de suas práticas e costumes; do ponto de vista econômico e político, seus interesses que corporificam suas políticas internas, por meio dos diferentes grupos de atores, sejam governamentais, não-governamentais e interestatais. Essas políticas internas repercutem no cenário internacional, gerando os acontecimentos que compõe a gama variada de questões, que, segundo Fonseca, “vão da guerra à cooperação humana, de ações unilaterais de Estados soberanos a formas diversas – e amplas – de interdependência entre sistemas produtivos e as sociedades nacionais...”, tornando mais complexo o procedimento inicial para o início da análise de determinado fato a ser esclarecido.
Fonseca expõe que “os problemas cotidianos poderiam [...] indicar as indagações que faríamos aos elaboradores de teoria”, não chegando a respostas conclusivas, mas que auxiliasse no esclarecimento dos rumos das ações e os resultados gerados decorrentes destas.

Daí que converge com o que pretendo expor ao nível do indivíduo ou grupo de indivíduos e os tipos de governos que compõem os Estados, onde o autor expõe como exemplo, o conflito na ex-Iugoslávia, com peso
“nos fatores étnicos na origem dos conflitos, sobre os modos através dos quais a comunidade opera em situações de crise, sobre a dinâmica regional européia, sobre lideranças (diga-se de passagem, formado por indivíduos que tem seus interesses) que usam o nacionalismo agressivo como instrumento para consolidar o poder nacional e tantos outros temas correlatos”. (FONSECA, 1994, p. 73)

E aqui, um questionamento pertinente do autor que expressa a dificuldade em “como formular hipóteses válidas, tão próximas das flutuações psicológicas de lideranças carismáticas ou dos embates intra-burocráticos?” (FONSECA, 1994, p. 74)

Penso que seja possível, mas estas hipóteses em breve curso do tempo perdem sua validade, pois o indivíduo se encontra em processo contínuo de evolução, ainda levando-se em consideração, as flutuações de interesses pelos quais passam os diferentes governos de um Estado, e o comportamento multifacetado dos diferentes atores que compõem o sistema internacional, corroborado por Fonseca quando expõe que “em ciências sociais, é extremamente difícil – senão impossível – o estabelecimento de hipóteses tão acabadas como nas ciências da natureza”. (FONSECA, 1994, p. 75)

Isso se torna um fato deveras complexo, pois as teorias com o passar do tempo se mostram engessadas e deficientes em tentar explicar fatos mais atuais que antes se mostravam mais coerentes com as suas premissas. Isto porque o conhecimento humano também se expande, tornando seu comportamento mais complexo e apresentando novas repercussões no cenário interno e internacional. É como se cada teoria enxerga-se apenas uma faceta do complexo comportamento humano, em cada época de nossa  história em que foi documentada.

Penso a necessidade de se ponderar com os interesses, as intencionalidades do aqui-agora das ações a que os governos se movem diariamente com clareza das repercussões internas e externas que se produzissem. Mas quem estaria disponível a tal empreendimento?

Portanto, as teorias precisam constantemente estarem evoluindo em outro sentido para que possam não somente acompanhar paralelamente as ações humanas, mas também nortearem as ações que ocorram em repercussões menos destrutivas pelas quais estamos passando, sejam guerras, conflitos étnicos ou a destruição de nosso meio-ambiente, tonando-se “verdades relativas de ponta”, ou seja, a evolução constante da teoria que exemplifique a evolução da consciência humana e sua atuação a nível estatal e mundial, talvez, possibilitando uma análise mais abrangente e integrada dos diversos níveis de análise, não somente associada à sensibilidade, mas também ao nível da visão de conjunto do analista.

Leandro Guiraldeli