domingo, 18 de novembro de 2012

A Nova Cultura e a Desamericanização da Vida.

A Nova Cultura e a Desamericanização da Vida.

Ascensão e queda das Ideologias, e os ciclos de aprendizagem e mudança coletiva.


A interpretação da História, ainda que por meios documentais, depende muito da motivação de quem a faz. Acontece que ao olhar o desenvolvimento social pelo viés econômico-progressista - o mais comum -, corre-se o risco de deixar de lado as questões humanistas, laborais, ecológicas, políticas e uma infinidade de outras variáveis.

Vejamos esses pontos em detalhes...

Aceleração da História.
Há 150 anos, a História ensaiava um grande salto. Nos países primeiro-mundistas, o pensamento econômico apostava suas fichas na Indústria como mola-propulsora das Sociedades.

O Desenvolvimentismo passou a depender do Consumismo, e tornara-se sinônimo de Industrialização e Produção de Bens de Massa - a chamada segunda onda (TOFFLER, 1980).

O discurso modernista bastava para justificar a espoliação dos recursos naturais. O mundo se (re)inventava.

Na linha-de-produção, "inventa-se" o dejeto fabril. Nas florestas "inventava-se" o desmatamento e nas fornalhas, a poluição, para gerar carvão. Enquanto isso, no chão de fábrica, "inventava-se" o homem-máquina e a nova "neurose".

Na virada para o Séc. XX, o pensamento ecológico praticamente não existia. O pensamento psico-humanista resignava-se com a marginalidade dentro da academia. Época em que despontavam FREUD e seu pensamento desafiador do senso comum, e JUNG - seu interlocutor mais preparado -, então uma jovem promessa.

Ascensão e Queda das Ideologias.
Pois bem, mais de um século depois, chegamos ao Séc. XXI. Diante do reconhecimento de que o modelo é autofágico, ganham importância os pensadores - a luz no fim do túnel - que sustentam a necessária reconciliação do pensamento econômico com o pensamento eco-humanista.

Na esteira do esgotamento de recursos, a crítica (eco)nômica enfim começa a questionar o materialismo aquisitivo - que era o valor supremo emergente da industrialização - e começa a incorporar a intenção da (eco)sustentabilidade e da (eco)eficiência nas práticas e no discurso.

Mas a promessa do futuro ainda falha porque a crise humanista igualmente resultante do mesmo modelo, infelizmente, é pouco compreendida. A ideologia que dá "carta-branca" a alguns (cultura dominante) para produzir felicidade a custa de muitos, é a mesma que até a pouco ignorava a força de muitos (contra-cultura interconectada) para reinventar o próprio modelo e, na sequência, questionar as bases na qual se estabelece a felicidade.

Para alguém que ache que a Sociedade é viável do jeito que está, recomendo a leitura atenta aos jornais diários. Facilmente lê-se sobre a crise de lideranças (política), a explosão demográfica, a concentração de riqueza, o problema básico da ética, a manipulação da informação, a violência urbana e o terrorismo.

Assuntos que não saem das pautas. Daí se vê que o gargalo civilizatório vai muito além do G-7. E não é de hoje.

Em toda a história civilizatória, nunca houve um instrumento capaz de organizar e interligar seres humanos em larga escala. Com a Internet, a perspectiva é outra.

Ciclos de Aprendizagem e Mudança Coletiva.
Há pesquisas em Economia Evolucionária (DEVEZAS e MODELSKY, 2004) que compreendem o momento atual como co-evolução de três transições: a mudança da onda tecno-econômica (ascensão das biociências), uma viragem no ciclo geopolítico (fim da Pax Americana) e inclusive, também, a provável mudança num ciclo muito mais longo que alguns designam de afirmação da "opinião mundial" (Onda do Interacionismo inaugurada com a "Galáxia da Internet"). Por estes motivos, o momento atual seria único.

Ciclos Históricos Longos.
Ao "reler" o passado com os óculos de vários tipos de ciclos de longa duração (Millenial Learning Process), T. Devezas, G. Modelski; tratam a dinâmica histórica como um processo "evolucionário" baseado na aprendizagem coletiva transmitida pelas mudanças geracionais (tecnicamente de 30 em 30 anos).

Utilizam um modelo físico-matemático, baseado em princípios da teoria da evolução, usando algoritmos e robustez científica, para afirmarem que os ciclos "aninham-se uns nos outros" e "evoluem em conjunto".

Nas descontinuidades da Ascensão e Queda das Civilizações, para cada ciclo de longa duração, que corresponde a mudanças de valores, um novo eixo precisa emergir.

A Nova Cultura.
A História registra que o aspecto humano sempre foi "atropelado" pelo discurso desenvolvimentista. Invasões, saques, exploração, escravagismo. Haja desculpa esfarrapada!

O novo capítulo desta insensatez chama-se crise de identidades da pós-modernidade. A Indústria Cultural, nascida com a segunda onda, sustentáculo da sociedade de massa, viveu seu apogeu empacotando o entretenimento, agregando emoção espetaculosa, estereótipos e fascínio pela fama e "vendendo" como fórmula de felicidade para o relax do trabalhador braçal.

A compreensão do efeito da pulverização desses valores por décadas torna-se crítica para estudos relacionados a comunicação social, mídia e educação, por exemplo. O lado perverso da massificação é a Colonização Cultural, ameaçadora do futuro justamente porque escraviza e aliena as mentes.

Pobre homo fabris... Com a chegada da Sociedade da Informação, a sociedade se segmenta. O modelo que dissociava produção (bem-material) e cognição (bem-imaterial) do início da industrialização está tendo que ser repensado. A ideologia das "pessoas-máquinas" deteriora-se rapidamente.

Torna-se necessária a emergência de uma nova cultura, não para transmitir conceitos em escala industrial e massiva como a anterior, mas identificada com a terceira e quarta onda tecno-econômica, capaz de organizar pessoas por redes de afinidades e nichos de interesses comuns, a fim de possibilitar sua emancipação e com isso, a transição da sociedade.

Saída da "Matrix".
Não existe uma só resposta correta. É preciso avaliar as consequências das escolhas. Não se aprende sobre ética em cartilhas, do tipo: "isso eu posso, isso eu não posso". Crianças usam cartilhas. Para adultos, é desperdício de aprendizagem. É preciso aprender a questionar os porquês das coisas. É completamente diferente dizer "faço porque há uma Lei que me obriga" e "faço porque meu discernimento me diz que isto tem que ser feito e é o melhor para todos".

Em síntese, aprender sobre ética é aprender a fazer melhores escolhas pessoais. O homo sapiens precisa urgentemente aprimorar sua ética, para que se possa iniciar um revisionismo histórico capaz de (re)aprumar o sentido da evolução para todos. O princípio é de que não faz sentido conceituar uma Sociedade do Conhecimento sem a contraparte do conhecimento auto-referente, ou conhecimento de si mesmo (autoconhecimento). Neste ponto, o humano tem que caminhar junto com o social e não submisso como está, vivendo na "Matrix", sem o saber. Daí porque a necessidade de mudança no perfil de liderança.

Da ancestral liderança pela força e pelo dinheiro para a força de determinadas lideranças.
O que se pode esperar?

E é de se esperar que a mudança venha de fora do eixo anglo-euro-americano. Por que? Porque estas sociedades e suas Instituições estão atoladas demais com o modelo atual para que se disponham à tamanho (auto)enfrentamento.Posso estar equivocado. Mas penso que uma das dificuldades para estes países liderarem a renovação, fora o modelo mental cristalizado, paradoxalmente seria a barreira do estilo de vida ao qual se acostumaram e não querem rever (Money Society).

Nada tem de natural considerar a riqueza assentada na pobreza alheia, criando pesados estigmas perante as massas e suas legítimas pretensões por uma nova sociedade. E sem essa "neutralidade", difícil assumir o protagonismo a que me refiro, capaz de superar a onda de insatisfação e protestos. A Globalização não é só um movimento econômico. Carece de consenso.

Menos concreto, mas nem por isso desprezível, a expectativa mundial pelo que vai acontecer com a China, em seu processo acelerado de empoderamento, na hibridização de sua Filosofia e conjunto de Saberes Orientais Milenares com a abertura definitiva da sociedade chinesa, a despeito de um pós-Comunismo, ao longo das próximas 2 ou 3 décadas.

Quando isso amadurecer, teremos possivelmente uma lógica mundial (Knowledge Society) bem diferente da que existe hoje e, por isso, talvez, tão difícil de conceber, que dirá explicá-la, agora.

Teria a América do Sul alguma contribuição específica? E o Brasil, o gigante pela própria natureza? Talvez, quem sabe, depende...

Um pensamento a mais: Pergunto e questiono porque para mim, isto é mais importante do que ser o primeiro a responder. Se minhas perguntas têm algum valor para você, então considere meu esforço e disponha-se a questioná-las. Em debates, importa mais os argumentos que o certo/errado.

sábado, 16 de abril de 2011

Conversando sobre Política, na capital do país.

Conversando sobre Política, na capital do país.
A Política, na voz de três trabalhadores brasilienses.


Pra que falar mal da Política? A problemática já é auto-evidente mesmo... Estou aprendendo a ouvir mais e a refletir para fazer algo melhor.  A conscientização política se dá em níveis, e aos poucos.

Outro dia, estava em Brasilía participando do ENERI (Encontro Nacional de Estudantes de Relações Internacionais) quando presenciei uma conversa informal, e fiquei impressionado com o debate que se sucedeu, no qual só participei como ouvinte. O relato a seguir aconteceu num micro-ônibus, quando estava dando umas voltas por lá, conhecendo a cidade.

Sentados quase ao fundo do micro-ônibus, uma moça jovem puxa conversa com uma senhora - 50 e poucos anos, sobre a beleza das rosas artesanais que carregava numa bolsa. Ela se dirigia a uma exposição. A senhora, bem articulada e falante, era artesã e comerciante, e após falar dos seus artesanatos, falou de sua "missão", à frente de uma Associação de Artesãos.

Disse que na Associação havia uma luta para se conseguir um espaço negociado com o Poder Público para expor a produção.

Dizia que na Feirinha da Torre de TV, já fazia mais de 15 anos que aguardava na fila por um box, e os espaços acabavam na mão de quem "pagava" por eles. A maioria ali era de funcionários públicos. Falava com pertinência e entusiasmo, e a conversa veio enveredando para o lado ético e político, falando de como os interesses escusos e a corrupção atrapalhavam a vida do cidadão.

Um senhor do banco de trás não resistiu e, de solavanco, bradou: "Serra é ... o mesmo que FHC; Dilma é a pior ... é o PT ladrão, do Mensalão; eu voto no mais fraco, na Marina". Foi daí que me interessei por aquele debate suigeneris. Assumi a condição de "ouvinte". A moça jovem argumenta: "Falta educação política. Não há interesse. A ignorância é a arma deles. Se derem educação, o povo não vota mais neles. E o senhor [do banco de trás], referindo-se à mente do povo: "O povo pensa que é tudo ladrão. O novato também é ladrão. Então pra que escolher o novato, deixa lá o ladrão mesmo.... Mas agora é diferente, senhor! Agora tem o Ficha Limpa. Estou acompanhando de perto, diz a senhora artesã. O povo tem que fiscalizar, tem que saber o que está acontecendo. O político barrado pode recorrer, mas na 2a instância, já entra com três votos contra... Ah? Como assim?" bradou o senhor. "A senhora calmamente explicou a novidade dessa eleição. Em seguida, deu uma pausa, e retornou, dizendo: "O governo tinha que fazer a licitação [nos boxes] na Torre de TV. É área pública, dinheiro público. Quem ganha é quem tá pagando por fora. Moro em Brasília a muitos anos e não tem prioridade para mim. Na Associação não invadimos, porque respeitamos. A gente se quotiza. Mas tá cheio de gente que invade". A moça jovem puxa conversa:"O povo tem mesmo que fiscalizar".


O micro-ônibus faz uma curva e pára de fronte a uma praça, que achei bacana. A moça jovem sorri, se despede e desce, bem como outros passageiros. Me levanto, olho a senhora e o homem do banco de trás. Aceno com a cabeça e, com um sorriso cúmplice, faço denunciar que prestei atenção na conversa. De repente, já descendo, ouço: "Mas um dia a situação muda, ah muda... E saio pensativo, vislumbrando registrar o que presenciara.

Realmente, quando se quer, qualquer hora é hora, para aprender e para ensinar.

sábado, 1 de janeiro de 2011

Resenha | Vinte Anos de Crise - 1919-1939 | E. H. Carr

Resenha proposta pela disciplina Economia e Política Internacional.


Edward Hallett Carr, londrino, autor de 20 Anos de Crise, nasceu e viveu na era vitoriana, época da maior projeção do império britânico no cenário mundial nos âmbitos econômico e político. Vivenciou seus momentos dourados, bem como o de sua decadência frente a ascensão dos Estados Unidos no sistema internacional e, precisamente, o período entre-guerras que marcou o momento de maior crise entre a realidade dos interesses e as ideias de paz – dadas como utópicas - entre as nações que participaram da Liga das Nações, representadas pelos indivíduos, representantes das nações que participaram de sua formação, atuação e posterior fracasso.

O autor analisa e interpreta o período entre-guerras com base a cientificar o processo da Política Internacional, iniciando no discurso sobre o significado e análise da realidade dos fatos, o que leva primeiramente ao “objetivo”, aqui exposto como “a paz entre as nações”, que alimenta o pensamento para o desenvolvimento de tentativas de resolução do problema analisado; e da “utopia”, sendo como “soluções imaginativas”, o “novo”, ao que o texto, no contexto abordado do entre-guerras, faz referência à criação de um “Estado Mundial” e de uma “segurança coletiva” centrado num forum qual seja, a Liga das Nações.


Pode-se considerar a questão da real intencionalidade e percepção dos indivíduos envolvidos, ao qual aponta as “suposições não verificadas sobre o comportamento humano”; ou seja, quando há ou não a vontade de resolver o problema, as pessoas podem querer ou não fazer, o partir ou não para sua execução, promovendo ou não a ação que construirá, da melhor forma possível por meio das tentativas, a solução para o problema; conforme o autor afirma, seja para a cura de uma doença, a construção de uma ponte ou a solução de um problema de cunho político, assim promovendo bases teóricas em conjunção com a prática nos referidos campos do conhecimento, o que resulta nas Ciências -  Médica, Engenharia e Política, por exemplo. E isso é demonstrado por Carr, quando responde do porquê da “utopia” não se tornar realidade quando afirma que,
um dos fatos cujas causas terá de analisar é o de que poucas pessoas realmente desejam um “Estado mundial” ou “segurança coletiva”, e as que pensam que desejam, conceituam estas coisas de forma diferente e incompatível. Ele terá, por fim, alcançado um estágio em que o objetivo, por si só, revela-se estéril, e a análise da realidade impõe-se a ele como um ingrediente essencial de seu estudo”. (CARR, 1981, p.14)

Sua obra é uma crítica às ideias e práticas dadas como utópicas, afirmando e dando relevância ao Realismo quando expõe, com relação ao fato do interesse na criação de um Estado mundial e de uma segurança coletiva, sendo analisado com bases no comportamento humano e na sua real intenção do que era desejado (a utopia) e o executado (o agir para tal, tornar realidade) dos objetivos citados, proporcionando o vislumbre de que realmente não era o objetivo real a ser alcançado pelos Estados, representados por seus estadistas; fato demonstrado pelo aumento da tensão no entre-guerras culminando na 2ª Guerra Mundial.

Dadas estas condições, a obra perpasssa o momento histórico em que, vivenciado pelo autor, busca-se a manutenção do status-quo no sistema internacional, tendo a Grã-Bretanha como potência dominante, mas que já não conseguia se manter como tal desde o fim da 1ª. guerra mundial.

O sistema internacional estava mudando, e com a ascensão dos Estados Unidos e sua política protecionista, estava se tornando o maior exportador de bens de consumo e de capital, e a Grã-Bretanha tentava restaurar, ou retornar à época relativa ao fim do século XIX, onde vivenciara o auge de sua atuação como potência européia. Carr percebendo os interesses que determinavam a ação dos Estados e que estes tinham seus próprios objetivos e a forma de empregá-los; na obra, revela que a harmonia de interesses entre as nações não passava de uma forma de tentar manter o sistema político e econômico do século XIX, que era sustentado pelo padrão ouro e pela hegemonia britânica que, após a 1ª. guerra mundial, passava por crise que estava mostrando que o entre-guerras estava sendo o momento que simbolizava, definitivamente, uma ordem política e econômica mundial que estava em franca decadência.

Com a crise da economia européia em si, que sustentava a hierarquia entre os Estados naquela época, colocou-os em extrema tensão, principalmente àqueles que, dificilmente estavam em aceitar a realidade da perda de poder, bem como sua posição no sistema internacional; daí o fato de Carr apontar em sua obra, com base nas ideias utópicas ou o que se falava, e na realidade ou o que se executava, não haver coerência entre estes pontos onde via como base da crise, a incoerência no trato do poder com a moral, bem como nos fundamentos do Direito e a forma no trato de litígios,  repercutindo na incoerência da real intenção e ação dos estadistas, tão dita pautada na harmonia de interesses, que não se alinhava com o que era tratado na Liga das Nações, onde se mais enxergava os próprios interesses na manutenção do status quo, no afã em trazer de volta o cenário político e econômico da belle époque vivenciada pela Europa até o início da primeira grande guerra.


Leandro Guiraldeli

Resenha: A Ambição Imperial – G. John Ikenberry

Resenha proposta pela disciplina de Relações Internacionais Contemporâneas.

O autor esclarece sobre as estratégias macropolítica e econômica norte-americanas, onde se observa os interesses dos EUA de se manterem e se perpertuarem como hegemônicos no sistema internacional, sendo após o fim da 2ª. guerra mundial e após o ataque às torres do World Trade Center, onde cada fase haveria de produzir suas repercussões de acordo com seu contexto e que os fatos políticos e econômicos que geraram suas consequências, no antes e principalmente no após aos ataques às torres gêmeas, explicam o seu papel de hegemônicos, e que, utilizando de argumentos com fins a justificarem a sua defesa, dão-se a liberdade de atuarem além dos tratados e da soberania dos Estados  – denotando uma hegemonia imperialista - frente ao sistema internacional.

As duas macroestratégias, mesmo pautadas em tradições intelectuais divergentes, funcionaram com eficiência desde a década de 40, representadas pela realista e liberal. A macroestratégia realista promoveu importantes compromissos de segurança em todo o sistema internacional, enquanto que a estratégia econômica, pautada na tradição liberal, promoveu uma nova ordem por meio da abertura comercial, da democracia e de relações institucionais multilaterais, denotando que, por trás deste estratégia, os EUA haveriam de se valer de seu peso político para criar as regras que lhes agradassem e que protegeriam seus interesses na manutenção de seu poder e na ampliação de sua influência no sistema internacional. Assim, promoveram-se resultados positivos para a liderança norte-americana, exercendo seu poder ao mesmo tempo que puderam ter seus interesses atendidos, bem como o fortalecimento da rede constitutiva da comunidade internacional que se formou após o fim da Guerra Fria, conforme expressa por Ikenberry:
O estabelecimento de acordos com base em regras e parcerias políticas e que visam a segurança trouxe resultados positivos tanto para os Estados Unidos como para boa parte do mundo. Por volta do final dos anos 90, o produto dessas relações foi uma ordem política internacional de porte e sucesso sem precedentes; uma coalisão global formada por Estados democráricos e unida por meio de mercados, instituições e parcerias de segurança. (IKENBERRY, 2003, p.26)

Em suma, essa ordem foi erguida por meio de barganhas, com os EUA assumindo compromisso de proporcionar segurança aos parceiros asiáticos e europeus e no acesso aos mercados, à tecnologia e produtos norte-americanos na economia global aberta, tendo em troca, a devida confiança no fornecimento de apoio diplomático, econômico e logístico aos Estados Unidos, complementado pela barganha liberal, no qual os Estados asiáticos e europeus concordaram na aceitação da aliança dos EUA tendo-se inseridos no sistema político-econômico, de comum acordo. Isso proporcionou aos EUA o poder como hegemônicos, proporcionando segurança ao mundo, ao mesmo tempo que, em troca, os Estados concordaram em viver segundo seus valores.

Após o ataque sofrido às torres gêmeas, o governo norte-americano se vale do seu poder para dar forma a uma nova macroestratégia contra o terrorismo, alterando seu modo de lidar com o sistema internacional, sob nova postura de afrouxamento dos vínculos e das regras antes instituídas com seus parceiros globais, exercendo papel mais unilateral e preventivo, valendo-se de seu poderio bélico na gestão de uma nova ordem global pautada na segurança.

Os EUA iniciam esta nova fase, com foco na manutenção de seu status de hegemônico, baseando-se em sua força bélica, não mais se pautando pelas macroestratégias realistas e liberais, deixando sem sentido os antigos acordos e alianças e tomando para si o papel de protetor do mundo, o fiscalizador do cumprimento das regras; por meio de uma segurança paternalista pautada na autoridade da força militar ao invés da autoridade moral, de forma que nenhum outro Estado possa se equiparar ou desafiar o seu poder. Se vale desta prerrogativa, com base em ações preventivas, de passar por cima da soberania de outros Estados em busca do seu intento, onde quer que seja, para aniquilar com forças terroristas, mesmo sem ter a visão clara das ameaças.

O autor aponta como riscos da nova macroestratégia neo-imperial, a atuação dos EUA “destituídos de legitimidade e desvinculados das normas e instituições da ordem internacional do pós-guerra”, tornando-se mais hostis e proporcionando maiores dificuldades à concretização dos seus interesses, por fim, colocando-se em situação insustentável.

Com esta atitude, não consideram a decisão final das Nações Unidas, invadindo o Iraque sob pretexto de possuírem armas de destruição em massa – o que não foi provado - gerando grandes ônus decorrentes da manutenção das forças militares na restauração do Iraque e na manutenção das forças militares no Afeganistão, sem sucesso na captura de quem consideram ser o mentor dos ataques às torres gêmeas.

Por sua manifestação de forma coercitiva e arrogante, pode-se comparar a possível queda dos EUA como ao de outros impérios que se utilizaram destes mesmos meios coercitivos para manifestar sua força e atingir seus objetivos, livre de restrições impostas por regras ou normas de legitimidade. Essa atitude promoveu o sentimento anti-americanista no mundo, seu descontentamento com uma ordem internacional em que os EUA jogam de acordo apenas com suas próprias regras e que, direta ou indiretamente, tem-lhes causado grandes problemas por meio de crises financeiras.


Leandro Guiraldeli

Resenha: O Racista Mascarado – Carlos Fuentes


Resenha proposta pela disciplina de Relações Internacionais Contemporâneas.

Fuentes, no presente artigo, apresenta crítica a Samuel Hantington e sua obra “O Choque das Civilizações”, onde aborda a questão do xenofobismo apresentado pelo autor norte-americano e apresenta contra-argumentações contundentes de que, o choque inicial entre as civilizações, dada a forma dos contextos como ocorrem, podem muito mais enriquecer as culturas, dadas a multiplicidade de conhecimentos e o somatório de experiências, antes consideradas por Hantington como uma ameaça ao que Fuentes considera como um “puritanismo, que se encontra na base da cultura [...] dos Estados Unidos, que manifesta-se de tempos em tempos com cores chamativas”, e que agora, tem como alvo os latino-americanos provenientes do México, que somente vão trabalhar nos EUA, justamente por este promover a demanda, neste caso, para os mexicanos.

Estes são considerados por Hantington, uma ameaça à sociedade norte-americana, como invasores, exploradores e empobrecedores da economia, ensinuando atuarem como promotores de movimentos separatistas para a formação de uma nação à parte, onde apenas o espanhol fosse a língua oficial.

O autor contra-argumenta destacando a contribuição dos latino-americanos nos Estados Unidos, que bancam grande parte dos impostos e promovem grande força na economia, à qual geraria grande crise caso deixassem de atuar nela. E caso não fossem realmente importantes, não teriam chamado a atenção da classe política em promoverem seus programas televisivos em épocas de eleição, dirigidos aos imigrantes na língua espanhola.

Exemplifica a qualidade dos latinos em absorverem os costumes locais, sem perda de sua própria cultura, ressaltando o multiculturalismo promovido pela descendência espanhola, a qual não é inteiramente compreendida se não considerada toda a sua riqueza de sua formação racial e linguística, escancarando a atitude xenófoba e isolacionista do autor norte-americano.

Coloca em xeque a atitude isolacionista do autor norte-americano, promovido pelo medo da “balcanização” da sociedade norte-americana pelos mexicanos que, por natureza, sendo latinos, tem em sua manifestação o respeito pela diferença e pela diversidade, a começar pelo reconhecimento de si próprios, do reconhecimento pela interdependência e na valorização do ser humano em si, em “admitir que uma cultura perece no isolamento, mas se fortalece no contato com outras culturas”, argumentando que “a Itália romana, a Espanha ibérica e a França gaulesa enriqueceram-se entre si e enriqueceram as atuais sociedades do novo e do velho mundo”. (FUENTES, p. 63)

Considera o choque de civilizações uma ideologia de combate e medo, considerando por parte dos EUA, em ser uma potência, o perigo de definirem por si mesmos quem são bons e quem são maus na história das civilizações, provocando aumento do xenofobismo entre culturas, pautado em ocupações neocoloniais e principalmente na ignorância sobre as realidades culturais de outras sociedades, salientando que “o respeito ao desenvolvimento histórico  interno de uma sociedade e o respeito à ordem jurídica internacional são as bases para a construção comum de valores e um verdadeiro diálogo, e não, choque de civilizações” (FUENTES, p. 64), dando ênfase à questão de que, sucesso e fracasso em si não existem, e sim a forma de como os acontecimentos humanos são vivenciados de forma como são usados os instrumentos culturais de que dispõe as sociedades.

Está claro que, conforme Fuentes, a cultura isolacionista norte-americana e sua auto-determinação de “nação-exemplo” podem se tornar uma grande fraqueza de sua sociedade, colocando em contradição a sua tão propagada posição de país democrático.

Leandro Guiraldeli

Resenha: O Fim da Guerra Fria, a Guerra do Golfo e a noção de “Nova Ordem Mundial” - Georges Lamazière


Resenha proposta pela disciplina de Relações Internacionais Contemporâneas.

O autor apresenta em seu texto, o encadeamento de ideias sobre a sequência de acontecimentos desde o fim da guerra fria até a invasão do Iraque pelos Estados Unidos, os motivos segundo os planos estratégicos-militares norte-americanos para a construção e manutenção do que denominaram de “nova ordem mundial”, quando da queda da União Soviética, um dos pólos que mantinham o equilíbrio de poder na bipolaridade política-econômica-militar pós 2ª guerra.

Após a dissolução da URSS, a invasão do Iraque ocorre pautada na tecnologia e estratégias militares norte-americanas como forma de mostrar a hegemonia dos Estados Unidos ao mundo, bem como a supremacia política-econômica capitalista. Contudo, a ordem no sistema internacional é alterada devido a conflitos étnicos-religiosos, dando um novo parecer ao sistema internacional e novos desafios para sua manutenção, buscando por reformas ao invés de revoluções sem motivos para mais conflitos com a promessa do funcionamento do sistema de segurança coletiva da ONU, que antes estava impedido de operar na Guerra Fria.

E a invasão do Kuwait pelo Iraque, proporcionou aos Estados Unidos, motivos para chancelar sua hegemonia, demonstrando a possibilidade de ação internacional conjunta sob sua liderança, para enfrentar ameaças à paz e segurança, sendo suas ações legitimadas sob a proteção do cap. VII da Carta da ONU, colocando em evidência estar operando em temas globais, como a não-proliferação de armas de destruição em massa, direitos humanos, meio-ambiente – sendo um paradoxo, pois não participam em conjunto com outros atores em busca de soluções – e principalmente, em assegurar uma ordem regional estável, tendo a necessidade de garantir o suprimento de petróleo a longo prazo e com preços razoáveis para o Ocidente, impedindo o controle do óleo kuwaitiano pelos Iraque. Por um lado, os objetivos também reuniam outros atores importantes no jogo diplomático, com convergência e divergência de objetivos, evidenciando a complexidade no novo sistema.

A nova ordem pós-Guerra Fria também possibilitava o funcionamento, mesmo que imperfeito, do sistema de segurança coletiva da ONU, sob pretexto dos Estados Unidos, de ser tão somente a implementação dos mecanismos descritos na Carta, mas exaltando o Cap. VII quanto ao uso legítimo da força, forte argumento utilizado para a invasão do Iraque para fazer cessar seu avanço, promovendo a legítima defesa do território kuwaitiano.

Percebe-se que toda a ação norte-americana pós-Guerra Fria com a invasão ao Iraque coloca-se sob pretexto do uso do Cap. VII da Carta da ONU, retornando em pauta o assunto da não proliferação de armas e utiliando-a para o desarmamento do Iraque, com vistas à obtenção do petróleo, matriz energética que seguramente, o garante na hegemonia político-econômica ocidental, ainda que, mantendo uma unipolaridade no terreno militar, pautada em sua superioridade bélica, coloca-se como “xerife do mundo”, líder em nome da segurança coletiva para manter-se dentro da crescente multipolaridade econômica, sem, contudo, utilizar da força e sim, da ordem consentida desempenhada pelos regimes internacionais no funcionamento do sistema econômico globalizado.

Leandro Guiraldeli

Resenha: As Contradições da Manutenção da Paz – As Nações Unidas na Nova Era - James Mayall


Resenha proposta pela disciplina de Relações Internacionacionais Contemporâneas.

No presente artigo, o autor expõe as dificuldades existentes das Nações Unidas em atuar com eficiência em suas missões de paz pós-guerra fria pelo mundo, devido às inúmeras dificuldades existentes que sustentem uma coerência dos Estados em promoverem uma nova era de paz no sistema internacional.

O aumento da demanda de atividades e uma crise financeira mundial ocorrendo ao mesmo tempo, somado à falta de compreensão das culturas onde haveriam de atuar, evidenciaram a falta de organização na formação das missões responsáveis por atuarem nas regiões onde haveriam de trabalhar pela manutenção da paz nas regiões em conflito, não promovendo a eficiência da atuação da ONU.

Penso que as contradições advenham da falta de maior entrosamente entre os Estados inseridos nas missões em que se comprometeram e ao conflito de interesses dos governos envolvidos com o comércio de armas que sustentam os inúmeros conflitos regionais que ocorrem por todo o sistema internacional. Devido a imaturidade dos Estados que compõem o conjunto da ONU, tanto quanto o Conselho de Segurança, conforme afirma Mayall,
que as grandes potências estão mais preocupadas com interesses de curto prazo e com as pressões políticas do que com a conversão das Nações Unidas em um instrumento confiável para a manutenção da paz [...] difícil, pois, fugir da conclusão de que a menor qualidade das Resoluções do Conselho de Segurança revela uma incerteza bem profunda acerca do tipo de ordem internacional que elas pretendem promover (MAYALL, 1995, p. 234)
pressupõe sua baixa eficiência em suas atividades, evidenciado pela baixa qualificação de pessoal recrutado, pela deficiência de conhecimentos da língua e da cultura onde haveriam de atuar, além de não transmitirem a devida segurança, que deveria ser pautada na imparcialidade e isenção das missões dirigidas às partes envolvidas nos conflitos, denunciando uma maior atuação universalista da Organização, obviamente, dos Estados que a compõe. Observa-se regimes políticos de muitos Estados do sistema internacional que ainda não atuam de forma democrática, arraigados à sistemas políticos autoritários e paternalistas, dificultando a atuação das Nações Unidas.

Possivelmente, de todas as contradições existentes que ainda impossibilita uma maior eficiência na atuação da ONU, seja as atividades dos atores transnacionais envolvidos na produção e comércio de armas que alimentam as guerras regionais e conflitos civis, seja pela disputa de matérias-primas energéticas e tantas outras atividades promotoras de conflitos políticos e étnicos internos que promovem o fluxo da produção e comércio bélicos.

A intencionalidade de muitos governos ainda é dúbia, pois os interesses políticos e econômicos internos acabam por não condizer com os interesses promovidos pela cultura de paz promovida pela ONU. Ainda perdura a contradição dos que dizem querer a paz mas que alimentam as guerras, pois não abrem mão dos lucros que a indústria e o comércio belicista promovem, a exemplo dos Estados Unidos, maiores produtores de armas do mundo, mas que se dizem portadores de uma “nova ordem mundial”, afirmado pelo então presidente norte-americano George Bush em discurso perante o Congresso dos Estados Unidos (11.09.1990), que esta nova ordem seria para a “promoção de um mundo onde o princípio de direito suplante a lei da selva. Um mundo onde as nações reconheçam a responsabilidade compartilhada pela liberdade e justiça. Um mundo onde o forte respeite os direitos do fraco”, o que não se mostrou condizente da forma como este país atuou na ocupação do Iraque em 2003, não respeitando a decisão do Conselho de Segurança da ONU, mostrando claramente que os princípios do Conselho de Segurança ou das Nações Unidas como um todo, se aplicam à todos os Estados participantes, mas não aos Estados Unidos quando de encontro aos seus interesses particulares.

Leandro Guiraldeli